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Conferências e Participantes

Abel Barros Baptista, Universidade Nova de Lisboa

 

Razão de se publicarem os heterónimos ortonimamente

 

A comunicação parte da ideia, já presente em trabalhos recentes, de que o cerne dos problemas não examinados da chamada heteronímia é o ortónimo. Trata-se, desde logo, de analisar o processo de formação da própria palavra desde a inscrição original na «Tábua bibliográfica» (1928) como princípio de discriminação da obra publicada; trata-se, depois, de interrogar a viabilidade de usar o termo «ortónimo» fora do âmbito da edição; e trata-se, enfim, de desmantelar o privilégio que a torna correspondente à perífrase «Pessoa ele mesmo» ou sinónimo de «o próprio autor».

 

Nota biográfica

Abel Barros Baptista é professor da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa. Publicou vários livros e estudos sobre temas de literatura portuguesa e brasileira. Fundou e coordenou o Laboratório de Estudos Literários Avançados (Elab), onde surgiu o projecto Estranhar Pessoa.

 

 

Ana Almeida, Universidade de Lisboa

 

O teu Fernando Pessoa

A minha conferência pretende discutir as consequências do estudo da literatura na nossa relação com os autores de que gostamos, a partir de aspectos da obra de Fernando Pessoa e tendo em vista a reconsideração de alguns pontos de vista familiares a seu respeito.

 

Nota biográfica

Ana Almeida nasceu em Luanda em 1982 e doutorou-se em Teoria da Literatura, em 2012, na Universidade de Lisboa. Em 2013, foi uma das vencedoras do 2 º Prêmio de ensaísmo serrote do Instituto Moreira Salles.

 

 

Ana Maria Freitas, Universidade Nova de Lisboa

 

Fernando Pessoa e a polémica Cadbury

 

No inicio do século XX, a utilização  de trabalho escravo  nas roças de cacau da colónia portuguesa de S. Tomé foi denunciado por uma investigação jornalística inglesa. Essa denúncia implicava a Cadbury’s, grande fábrica de chocolates compradora  desse cacau, e causou grande escândalo e polémica. A ampla divulgação das atrocidades, através de artigos em jornais e de um livro com fotografias, originou o boicote de produtos e a troca de acusações entre governos e instituições dos dois países. Fernando Pessoa, que se chegou a definir como “um português à inglesa” e que regressara a Portugal pouco antes,  sentiu necessidade de elaborar uma resposta às acusações. Nesse texto sob forma de panfleto e que não chegou a publicar, analisa os aspectos  psicológicos por detrás  do carácter inglês, da sua filantropia e do seu mercantilismo. Revelador de um desejo de intervenção que se manifestou noutras ocasiões (vide  “Aviso por Causa da Moral, e “Sobre um Manifesto de Estudantes”, por exemplo), o texto possui ainda a qualidade de nos esclarecer sobre a posição de Fernando Pessoa  face ao seu país de origem, à Inglaterra e ao Dark Continent, a África onde viveu anos formativos e que está tão pouco presente na sua obra.

 

Nota biográfica

Ana Maria de Almeida Pires de Freitas é doutorada em Literaturas Românicas Contemporâneas e investigadora integrada do IELT (Instituto de Estudos de Literatura e Tradição) da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, da Universidade Nova de Lisboa. Investiga o espólio de Fernando Pessoa, tendo publicado  várias edições da sua obra: Pessoa Ortónimo, vols I, II e III (em colaboração), Quaresma, Decifrador, Histórias de um Raciocinador e O Mendigo. Integra presentemente a equipa de investigação do projecto Modernismo online - Espólio de Almada Negreiros e Sarah Affonso.

 

 

Ana Pinto Leite, Universidade de Lisboa

 

“Observar o todo de fora”

A impossibilidade em Pessoa, Wittgenstein e Kierkegaard

 

Wittgenstein escreve numa entrada de diário, aludindo a Kierkegaard: “Aquilo que represento, por assim dizer, no teatro da minha alma não torna o seu estado mais belo, antes mais detestável. E, no entanto, acredito sempre tornar o seu estado mais belo através de uma bela cena no teatro. Porque estou sentado na plateia em vez de observar o todo de fora. Porque não gosto de estar de pé na rua sóbria, quotidiana e desagradável, mas gosto de estar sentado na plateia quente e agradável.”

A vontade e impossibilidade de “observar o todo de fora” é o problema que une Wittgenstein a Kierkegaard; mas também ambos a Pessoa.

Em Wittgenstein, esta impossibilidade é geralmente ligada à dificuldade que reconheceu muitas vezes de superar um modo de expressão aforístico; em Kierkegaard, muitos comentadores sugerem que está na base do seu recurso a pseudonímia; em Pessoa, a quem se atribuem ambas as tendências, a impossibilidade será discutida a partir do Livro do Desassossego.

 

Nota biográfica

Ana Pinto Leite é licenciada em Línguas, Literaturas e Culturas (Major em Estudos Alemães) pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa (FLUL) e mestre em Teoria da Literatura na mesma instituição. É membro do Centro de Filosofia da Universidade de Lisboa, onde tem colaborado no grupo de investigação que se dedica à tradução das obras de Kierkegaard. Realiza actualmente um doutoramento em torno de Wittgenstein e Kierkegaard no Programa em Teoria da Literatura na FLUL.

 

 

Anna M. Klobucka, University of Massachusetts Dartmouth

 

Sonetos com manteiga e Lorca em Lisboa: Para uma revisão do contexto modernista dos estudos pessoanos

 

Partindo da consideração de alguns textos e eventos periféricos em relação ao cânone histórico-literário do Modernismo português, esta comunicação pretende interrogar e, eventualmente, enriquecer a narrativa vigente sobre a produção literária e cultural do período, alargando o elenco dos seus protagonistas e o repertório dos seus enredos, particularmente no que diz respeito à articulação recíproca entre os estudos modernistas e os estudos pessoanos. Os tópicos principais que orientarão esta interrogação são: 1) a relação entre a produção poética coeva de autoria feminina (representada depreciativamente por António Ferro como “torradas e sonetos com manteiga das cinco às oito”) e o cânone modernista português; e 2) o cosmopolitismo queer que define algumas das correntes transnacionais do intercâmbio literário modernista (fenómeno sinalizado aqui pela visita—ao que tudo indica, fictícia—de Federico García Lorca a Lisboa e pela narrativa desta visita que António Botto aproveita, entre outros fins, para colocar na boca de Lorca um parecer simultaneamente estético e afetivo sobre a poesia de Pessoa).

 

Nota biográfica

Anna M. Klobucka é professora no Departamento de Português da Universidade de Massachusetts Dartmouth (EUA), onde ensina principalmente literatura portuguesa e literaturas africanas em língua portuguesa. É autora de O Formato Mulher: A Emergência da Autoria Feminina na Poesia Portuguesa (Angelus Novus, 2009) e Mariana Alcoforado: Formação de um Mito Cultural (IN-CM, 2006; ed. original Bucknell University Press, 2000). Co-organizou também (com Helena Kaufman) After the Revolution: Twenty Years of Portuguese Literature 1974-1994 (Bucknell, 1997) e, com Mark Sabine, O Corpo em Pessoa: Corporalidade, Género, Sexualidade (Assírio & Alvim, 2010; ed original University of Toronto Press, 2007).

 

 

António Fernando Cascais, Universidade Nova de Lisboa

 

Pessoa, génio, loucura e ciência da degenerescência

 

Embora já bem documentada, a relação de Fernando Pessoa com a ciência antropológica e psiquiátrica não foi ainda suficientemente explorada analiticamente, o que o presente texto pretende empreender, debruçando-se sobre a receção pessoana das teorias da degenerescência por intermédio da leitura que faz de Max Nordau e da discussão com Júlio de Matos, bem assim como da consulta de Egas Moniz. A análise será contextualizada no quadro geral da relação entre o desenvolvimento da obra pessoana e a difusão e assimilação, no meio científico e cultural português, do state of the art da medicina e da psiquiatria da época. Será dada particular atenção ao recurso de Pessoa a algumas noções e categorias médicas e psiquiátricas como aparato concetual de interpretação da relação entre génio e loucura e, designadamente, da categoria de histero-neurastenia, como instrumento para a autocompreensão do nexo entre a biografia e a obra, e sobretudo como abordagem da sua própria heteronímia, em paralelo com a sua relação conflitual com a psicanálise. Em complemento, será considerada a permeabilidade de Pessoa ao “mundo de sentido” das categorias médico-psiquiátricas como horizonte de inteligibilidade que aplica à sua leitura das obras de António Botto e de Mário de Sá-Carneiro.  

 

Nota biográfica

António Fernando Cascais é Professor Auxiliar no Departamento de Ciências da Comunicação da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa e investigador do Centro de Estudos de Comunicação e Linguagens onde coordenou os projectos FCT de I&D Modelos e Práticas de Comunicação da Ciência em Portugal (2004-2009) e História da Cultura Visual da Medicina em Portugal (2009-2013). Organizou três nºs da Revista de Comunicação e Linguagens - “Mediação dos Saberes”, “Michel Foucault. Uma Analítica da Experiência” e “Corpo, Técnica, Subjectividades” - e os livros Indisciplinar a teoria (Fenda, 2004) e A sida por um fio (Vega, 1997).

 

 

António M. Feijó, Universidade de Lisboa

 

A necessidade do dia triunfal

 

A análise filológica dos manuscritos de O Guardador de Rebanhos feita por Ivo Castro parece ter impugnado decisivamente a pretensão, reiterada por Pessoa, de que a série teria sido escrita num único dia. Teria sido escrita, em vez disso, durante um período de dois meses, de 4 de Março, dia em que o poema I foi redigido, até 10 de Maio de 1914, em que o poema XLVI fechou a sequência. Nem o nome do autor, Alberto Caeiro, nem o título da sequência surgiram imediatamente, e são, de facto, adições tardias a um corpo de texto crescente. Tendo deflacionado a pretensão de Pessoa a um único dia triunfal, em que aparentemente nenhum poema foi escrito, Ivo Castro concede, todavia, que Pessoa é “genericamente” fiel na sua descrição da “cronologia real da génese” do ciclo. Mas o facto permanece: uma origem serial e difusa foi condensada num único dia. Luciana Stegagno Picchio, reconhecendo todavia a fiabilidade da descrição alternativa de Ivo Castro, persistiu em defender a existência de um dia triunfal. Escolhia assim, escreve, a poesia contra a natureza empírica da filologia. Pelo meu lado, a posição que adopto na descrição do dia triunfal toma por irrefutável a descrição de Castro e por certa a posição de Picchio, embora não pelas razões que ela expõe. O dia triunfal de Pessoa é sistemicamente requerido, e foi, de facto, o dia 8 de Março de 1914.

 

 

Nota biográfica

Professor catedrático do Programa em Teoria da Literatura e do Departamento de Estudos Anglísticos da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Foi Director da Faculdade de Letras da UL. Actualmente Vice-Reitor da Universidade de Lisboa. Autor de ensaios sobre autores portugueses e de expressão inglesa. Autor de dramaturgias para cena e de uma exposição sobre literatura. Tradutor.

 

 

Armando Nascimento Rosa, Instituto Politécnico de Lisboa

 

Patrício, Pessoa, Campos, Nietzsche: Diálogo em quatro vozes

 

António Patrício (1878-1930) foi um autor admirado por Fernando Pessoa, ou melhor, o Patrício contista de Serão Inquieto (1910), livro que Pessoa tentou fazer traduzir e publicar em Espanha, em 1923, por intermédio de Adriano del Valle. Dirigindo-se a Mário de Sá-Carneiro, escrevera Pessoa em vida do poeta revelando o ágon exigente que o amigo necessitaria empreender para com a obra do Patrício contista, um escritor geracionalmente anterior aos de Orpheu. No que toca ao Patrício dramaturgo, com cinco peças publicadas entre 1909 e 1924, o silêncio de Pessoa a seu respeito (conforme já o discuti anteriormente em As máscaras nigromantes - Uma leitura do teatro escrito de António Patrício, 2003) proporciona sugestivas conjecturas, se pensarmos o quanto várias realizações do teatro escrito patriciano surgem estética e tematicamente próximas de projectos dramatúrgicos que Pessoa desejou concretizar. Já num fragmento atribuível a uma variante do «Ultimatum», a voz de Álvaro de Campos não terá elogio mas ácida sátira dirigida ao nietzschiano Patrício d’ O Fim (1909) e de «Diálogo com uma águia» (1910).

A presente comunicação pretende avaliar a presença de Patrício em Pessoa, ora empática, ora conflitual, com a comparência de Campos e de Nietzsche como personagens para um confronto a quatro vozes.

 

Nota biográfica

Armando Nascimento Rosa, doutorado em Estudos Portugueses, pela Universidade Nova de Lisboa, é professor na Escola Superior de Teatro e Cinema do Instituto Politécnico de Lisboa, membro integrado do CIAC (Centro de Investigação em Artes e Comunicação), e investigador colaborador do CETUP (Centro de Estudos Teatrais da Universidade do Porto). Dramaturgo e criador musical, é autor de mais de vinte peças teatrais, algumas delas premiadas com diversas distinções e traduzidas em várias línguas. Concebeu e desenvolve o projecto musical O Piano em Pessoa, com o pianista António Neves da Silva, estreado em concerto na Universidade de Barcelona (2012).

 

 

Bartholomew Ryan, Universidade Nova de Lisboa

 

Criando um Mito: Ficções Verdadeiras em Pessoa e Kierkegaard


Nesta comunicação, estabeleço uma ligação entre o poeta Pessoa e o filósofo Kierkegaard – autores de dois pontos opostos da Europa - que alcançaram, com grande profundidade artística, criar um legado para a sua autoria ao transformá-la numa fábula. Pessoa imortalizou o seu 8 de Março em “Notas para a recordação do meu mestre Alberto Caeiro”, por Álvaro de Campos, que excede Platão no seu humor e auto-crítica; Kierkegaard com o seu altamente irónico e perspicaz “Side-Glance at Contemporary Danish Literature”, escrito pelo seu pseudónimo Johannes Climacus. Ambos os textos fabulados são análises intensas dos seus respectivos autores ficcionais, incluindo os autores que pensamos conhecer como Pessoa e Kierkegaard. Ao ligar o poeta e o filósofo, esta comunicação discute como estes autores constroem uma “piada”, um jogo, ao mostrar a virtude da “verdade poética” de Vico e confirmando as palavras últimas de Yeats: “You can refute Hegel but not the Saint or the Song of Sixpence.” Em ambos, a fábula é tal que não importa se esta é, ou não, verdadeira. O que importa é a verdade do seu poder simbólico e imaginativo.

 

Nota biográfica

Bartholomew Ryan é Postdoctoral Fellow no Instituto de Filosofia da Nova da Universidade Nova de Lisboa. É detentor de diversos graus académicos: PhD da Aarhus Universitet, Denmark, MA no University College, Dublin, e BA no Trinity College, Dublin. Foi Professor do European College of Liberal Arts em Berlim (2007-2011) e Lady Margaret Hall, na Universidade de Oxford (2010), e ainda investigador associado do Søren Kierkegaard Research Centre em Copenhaga e St. Olaf College, Minnesota. Escreveu consideravelmente sobre Kierkegaard e teoria crítica, tendo publicado artigos sobre Nietzsche, Joyce, Shakespeare e Carl Schmitt. O seu livro Kierkegaard’s Indirect Politics: Interludes with Lukács, Schmitt, Benjamin and Adorno será publicado em 2014 com a editora Rodopi.

 

 

Bruno Béu de Carvalho, Universidade de Lisboa

 

“More than this, oh,... nothing”: o discurso tautológico como procedimento apofático na poesia de Alberto Caeiro

 

Por detrás do aparecimento triunfal de Caeiro está o aparecimento de um dispositivo discursivo. Mais do que a tautologia, é o discurso tautológico esse dispositivo-Caeiro. Ele é dominante, não apenas onde na sua poesia se detecta claramente a sua figura proposicional, mas onde ele funciona. Assim, procuraremos mostrar como, em Caeiro, a tautologia é, não apenas incomum e um fenómeno complexo (longe portanto do mero truísmo), mas, mais singularmente, como essa complexidade lhe advém de uma negatividade radical com que opera e produz discurso. Se, comummente, o tautológico é proposicionalmente afirmativo, o que é dizer catafático, em Caeiro, e quase paradoxalmente, é a tautologia apofática, ou seja, não apenas denegadora, mas autodenegadora.

Assim «virado do avesso», tal discurso tautológico propõe uma radicalização formal do omni determinatio est negatio espinoziano. Faremos este percurso: mostrar de que modo, em Caeiro, é a tautologia, não apenas o dispositivo dominante da sua poesia, mas, discursiva e logicamente, um procedimento sui generis (não mera expressão do princípio de identidade); perceber o apofatismo nos mais recentes estudos que sobre ele têm sido realizados, e que o entendem não enquanto mera replicação de proposições do tipo ‘A não é x’, mas como fenómeno ultra-dinâmico, e propriamente discursivo; mostrar, por fim, de que modo se surpreende essa dinâmica negativa caracterizando, quer o modo singular da tautologia, quer o contexto tautológico da poesia de Caeiro.

 

Nota biográfica

 

Em 2012, concluiu o seu doutoramento em Filosofia na Universidade de Lisboa, com o título Interrogatividade e apofatismo no pensamento de Vergílio Ferreira, realizado com o patrocínio da Fundação para a Ciência e Tecnologia. Integrou, em 2008, a equipa que digitalizou a marginalia e biblioteca pessoal de Fernando Pessoa. Tem proferido comunicações epublicado artigos nas áreas de Filosofia e Literatura portuguesas do séc. XX, Filosofia Antiga, Estética e Filosofia da Religião. Em 2012, foi docente convidado, na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, do seminário de pós-graduação Mística cristã e gnose oriental. Coordena um seminário permanente do Centro de Filosofia da Universidade de Lisboa,dedicado à Filosofia e Literatura portuguesas do séc. XX. É membro do Centro de Filosofia da Universidade de Lisboa, da Sociedade Ibero-Americana de Estudos Neoplatónicos e do Instituto de Filosofia Luso-Brasileira. Tem poesia publicada em antologias de poesia portuguesa contemporânea e revistas literárias.

 

 

Carla Gago, Freie Universitaet Berlin

 

Encenações modernistas entre discursos espíritas e heteronímicos: o triunfo da performatividade

 

Na arena da discussão crítica sobre o Modernismo, o paradigma positivo-racionalista e as correntes de fundo esotérico-ocultista são geralmente apresentados como par antinómico. No entanto, num enquadramento mais alargado, confrontando a História literária com a História das Ciências, vemos que o Esoterismo e o Ocultismo nos séculos XIX e XX deverão ser entendidos enquanto fenómeno histórico-cultural que não se encontra em tensão mas sim em afinidade com o Modernismo.

No âmbito das Ciências sociais e humanas e dos Estudos culturais, vários são, assim, os estudos na última década que vêm confirmar que os discursos místicos, ocultistas, esotéricos e espiritistas foram determinantes para a formação dos movimentos modernistas. No caso de Pessoa, também os discursos de fundo ocultista e espírita parecem ter sido decisivos nos processos performativos e discursivos da estética pessoana, nomeadamente na construção discursiva da heteronímia ou do “Dia Triunfal”. Estes discursos espíritas, parapsicológicos e psicológicos vão, assim, plasmar-se no próprio verbo pessoano, formatando, nomeadamente, o discurso do autor sobre a heteronímia e sobre o famoso “Dia Triunfal”.

 

Nota biográfica

Carla Gago estudou Línguas e Literaturas Modernas e Literatura Comparada nas universidades Nova de Lisboa, Humboldt e FU de Berlim. Foi leitora de Língua e Cultura portuguesas nas universidades de Rostock e Leipzig e doutorou-se na Universidade de Zurique com a tese "Drama em Pessoa: de modelos estético-normativos a um espaço utópico. Contextualização histórico-crítica de uma poética modernista". Professora no departamento de Filologia Românica da FU de Berlim, é também investigadora do Centro de História de Além-Mar da Universidade Nova de Lisboa. Tem vários artigos publicados sobre temas de Estudos Portugueses em revistas, enciclopédias de autores e volumes portugueses e internacionais. Trabalha actualmente num projecto de pós-doutoramento sobre Literatura e Ciência.

 

 

Cristina Zhou, Universidade de Coimbra

 

“E o meu coração é um pouco maior que o universo inteiro” – reflexão sobre a questão da Gnose em Fernando Pessoa

 

“Make yourself grow to immeasurable immensity... Collect in yourself all the sensations…” (Hermetica, ed. Copenhaver); “Sentir tudo de todas as maneiras...” (Fernando Pessoa). A questão do Conhecimento ocupa um lugar central na escrita pessoana. Como chegar ao Conhecimento verdadeiro? Através da razão científica, da fé religosa ou da Gnose esotérica? o nosso escritor/pensador manifesta um especial interesse pela última. Importantíssima na obra pessoana, a Gnose é um elemento estruturante na estratégia heteronímica e está intimamente ligada a várias encenações do poetodrama. Porém, como é frequente no nosso escritor da ironia, esse fascínio pela Gnose não está isento de cepticismo e oscilações. Eis o problema central no estudo sobre a relação de Pessoa com o esoterismo. Neste trabalho, pretendemos sintetizar e reflectir sobre as célebres e diferentes interpretações das manfestações do esoterismo na obra pessoana, focando sempre a questão da Gnose.

 

Nota biográfica

Cristina Zhou é doutoranda em Literatura de Língua Portuguesa na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. Obteve o grau de Mestre na mesma faculdade, com a dissertação «Mundividência Esotérica e Poética Iniciática de Fernando Pessoa». Actualmente encontra-se a preparar a tese de doutoramento «Problemática Metafísica e Especulação Esotérica na Poesia Portuguesa da Modernidade», com o apoio da Fundação Calouste Gulbenkian e sob a orientação do Prof. Doutor José Carlos Seabra Pereira e do Prof. Doutor Jerónimo Pizarro.

 

 

Diego Giménez, Universidade de Coimbra e Universidade de Barcelona

 

Codificação informática do Livro do Desassossego: do original ao digital

 

A base fragmentária da obra de Fernando Pessoa apresenta variações de tipo ortográfico, textual e material que são responsáveis pelas diferenças entre as várias edições do LdoD. A codificação dos testemunhos autorais e editoriais com a norma T.E.I. (Text Encoding Initiative) permite representar quer o processo de escrita, quer o processo de edição. A marcação XML codifica esses processos de forma a torná-los processáveis algoritmicamente.

 

Nota biográfica

Diego Giménez, licenciado em Filosofia pela Universidade de Barcelona (UB) e mestre em Estudos Literários na mesma universidade, tem realizado diferentes atividades relacionadas com a literatura e o jornalismo. Trabalhou na redação de La Vanguardia.com e cofundou em 2008 Revista de Letras. Atualmente realiza um doutoramento em literatura e pensamento na UB, tendo por objeto principal o Livro do Desassossego. É também investigador no Centro de Literatura Portuguesa da Universidade de Coimbra, onde trabalha no projeto «Nenhum Problema Tem Solução: Um Arquivo Digital do Livro do Desassossego» (PTDC/CLE-LLI/118713/2010).

 

 

Fabrizio Boscaglia, Universidade de Lisboa

 

O lugar da civilização islâmica no pensamento e na obra de Fernando Pessoa

 

Esta comunicação pretende dar a conhecer os resultados de uma investigação de quatro anos sobre a presença árabe-islâmica no pensamento e na obra de Fernando Pessoa. Assumindo Pessoa como poeta e pensador de Portugal, da Europa e do Ocidente, visa-se mostrar como o autor da Mensagem abordou vários aspetos da civilização islâmica, tanto na poesia ortónima, como na prosa filosófica, como ainda em textos sobre civilização e imperialismo. À luz dos documentos analisados, entre os quais vários inéditos, serão identificados os principais temas que Pessoa abordou, em algumas fases da sua vida e da sua obra, ao tratar do papel da civilização islâmica no processo de formação da cultura europeia bem como no constituir-se da própria obra e do pensamento pessoanos.

 

Nota biográfica

Fabrizio Boscaglia é mestre em Psicologia pela Universidade de Turim (Itália) e é membro do Centro de Filosofia da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Desenvolve investigação sobre a presença árabe-islâmica na literatura e no pensamento portugueses, especialmente na obra de Fernando Pessoa. É bolseiro da Fundação para a Ciência e a Tecnologia e da Fundação Calouste Gulbenkian. Participou no projeto de digitalização da biblioteca particular de Fernando Pessoa, na Casa Fernando Pessoa, em Lisboa. Colaborou como docente em Cursos de Especialização na Universidade de Lisboa. É conferencista e autor de publicações em Portugal e no estrangeiro. É coordenador do projeto turístico-cultural «Lisboa com Fernando Pessoa», realizado pela empresa Lisboa Autêntica com licença do Turismo de Portugal.

 

 

Fernando Beleza, University of Massachusetts Dartmouth

 

‘Um simulacro de mim’: Autobiografia e performatividade no Livro do desassossego de Bernardo Soares

 

Resumo. Ao contrário de vários textos da tradição autobiográfica—como as Confissões de Rousseau, frequentemente referidas por Soares—, o Livro do desassossego parece à superfície afastar a transgressão sexual como elemento estruturante. Esta comunicação argumenta que, no entanto, a sexualidade e os discursos normativos da modernidade são elementos cruciais para compreender o projecto do Livro enquanto “autobiografia sem factos”, inerente à segunda fase de escrita. Se o texto autobiográfico ocupou um lugar crucial na procura moderna do conhecimento sobre a “verdade” do sujeito, centrada na sexualidade (Foucault); por outro lado, o autobiográfico e a sua ficcionalização foram também locus para o estabelecimento de contradiscursos estéticos e para a contestação de noções fixas de identidade a partir das margens. Como a crítica tem mostrado, a deslocalização da noção de identidade enquanto expressão de uma essência fixa na interioridade para o campo da textualidade, da intersubjectividade e da performance foi uma destas respostas performativas. A partir de uma leitura da autobiografia de Soares à luz de Foucault, Derrida e Butler, a presente comunicação pretende colocar o Livro (1929-34), enquanto texto e projecto, nesta tendência moderna, argumentando que o tradicional foco colocado na textualidade do desassossego deve ser complementado por uma leitura da sua problematização da linguagem da interioridade—e de discursos que a naturalizam—e pela consequente localização da identidade, da sexualidade e da criação estética nos campos da indeterminação entre interioridade e exterioridade, intersubjectividade e performatividade.

 

Nota biográfica

Fernando Beleza é licenciado em Línguas e Literaturas Modernas pela Universidade de Coimbra e mestre em Estudos Literários, Culturais e Interartes pela Universidade do Porto. Actualmente encontra-se a terminar uma tese de doutoramento sobre as relações entre masculinidade, sexualidade e as políticas estética e cultural do primeiro modernismo português, com ênfase em Fernando Pessoa e Mário de Sá-Carneiro, na Universidade de Massachusetts, Dartmouth. É bolseiro da Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento. Tem apresentado comunicações em conferências internacionais e publicado ensaios sobre questões de género e sexualidade na literatura e cultura portuguesas (séculos XIX e XX), bem como na área dos estudos pós-coloniais lusófonos.

 

 

Fernando Cabral Martins, Universidade Nova de Lisboa

 

Alexander Search e Bernardo Soares

 

Há, primeiro, a questão do nome: da transparente metaforização do primeiro para a anagramatização não menos transparente do segundo. São tudo menos heterónimos, eis o que é marcado textualmente por esses nomes.

E também não são personagens como as personagens o são, D. Quijote ou Puffrock, Mefistófeles ou Hamlet, Nadja ou o Senhor Teste. Não são personagens fortes – aquelas que depois se transformam em antonomásias ou em símbolos. São antes disfarces ligeiros de si mesmo, menos ainda que uma autoficção ou um autofingimento propriamente ditos. São nomes de textos, são como os títulos de que fazem parte, o seu nome não é um nome de autor.

Apesar de tudo, a atracção pelo heterónimo é tal, na específica actividade escrita de Pessoa, que Alexander Search vê ser-lhe atribuído um cartão de visita com aquela que é a própria morada de Pessoa lá inscrita, e Bernardo Soares, que é apresentado e definido de modo claro como personagem do Livro do Desassossego, aparece designado na Carta a Casais Monteiro como um semi-heterónimo, uma espécie fantasmática de avatar do heterónimo-mestre de 1914. Só lhe falta uma data de nascimento, entre outros sinais particulares que também não tem.

Alexander Search e Bernardo Soares são apanhados pelo furacão das figuras de autor que habitam o mundo da literatura. Ou, se se preferir, são os heróis da história da literatura tal como o adolescente estudante a conhece e lê. Essa história e essa literatura são aquilo a que se chama o Romantismo.

 

Nota biográfica


Fernando Cabral Martins é professor na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa. Publicou ensaios sobre literatura portuguesa, nomeadamente Cesário Verde e Mário de Sá-Carneiro, organizou antologias e preparou várias edições anotadas de Fernando Pessoa, Mário de Sá-Carneiro, Almada Negreiros, Alexandre O’Neill e Luiza Neto Jorge. Coordenou um Dicionário de Fernando Pessoa e do Modernismo Português. Integra como investigador principal um projecto de arquivo online da obra édita e inédita de Almada Negreiros. Publicou livros de ficção.

 

 

Filipa Freitas, Universidade Nova de Lisboa

 

Disposição e desejo: conceitos em Álvaro de Campos

 

A filosofia e a literatura debruçam-se continuamente sobre alguns conceitos que estruturam o homem. É neste âmbito que se inserem a disposição e o desejo. Modeladores do ponto de vista do sujeito, estes dois conceitos são fundamentais para compreender a estrutura identitária do indivíduo real ou ficcional.

O complexo ponto de vista de Álvaro de Campos revela, em parte da sua obra, uma abertura à totalidade do mundo, geralmente analisada a partir das sensações, mas cuja estrutura assenta, principalmente, nos conceitos de disposição e de desejo.

Deste modo, a partir de alguns poemas de Campos (como as Odes), proponho-me a estabelecer e vincar as diferenças e semelhanças entre disposição e desejo e analisar a sua pertinência, funcionamento e caracterização no ponto de vista do heterónimo.

 

Nota biográfica

Filipa Freitas é licenciada em Estudos Portugueses e Lusófonos, mestre em Estudos Portugueses e mestre em Filosofia pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa (FCSH-UNL); actualmente é doutoranda em Filosofia (FCSH-UNL).

Foi Bolseira de Investigação no projecto HTPonline - documentos para a História do Teatro em Portugal (2009-2011), no Centro de Estudos de Teatro (CET-FL); no projecto Tetra (Teatro e  Tradução): Para uma história da tradução teatral em Portugal, 1800 - 2009 (2011), no Centro de Estudos Comparatistas (CEC-FL); actualmente no projecto Teatro de Autores Portugueses do Século XVII: uma biblioteca digital, no Centro de Estudos de Teatro.

 

 

Flávio Rodrigo Penteado, Universidade de São Paulo

 

Chorar lágrimas verdadeiras: ficção e performance na gênese dos heterônimos

 

Propõe-se analisar o componente ficcional e performativo da “carta sobre a gênese dos heterônimos”, percebida não enquanto documento acessório ou apenas fonte de informação, mas como obra de arte per se (conforme já sugeriu o próprio destinatário em texto que acompanha sua primeira publicação). Tal procedimento, além de evitar juízos como “verídico” ou “falacioso”, permite que se coloquem em perspectiva os traços de ficcionalidade que compõem a narração, repleta de movimentos de “possessão” e “retomada de consciência” que não apenas descortinam o nascimento dos heterônimos, como também simulam, no presente da escrita, um novo estado de elaboração e pulsão experimentado pelo escritor, semelhante ao do “dia triunfal”. À luz do que Antonio Tabucchi identificou, em outro contexto, como tradução, no plano do teatro (uma ficção), da ficção da vida (um teatro), são aproximadas, ainda, as “lágrimas verdadeiras” que Pessoa, quando assume a máscara de Álvaro de Campos, relata ter chorado durante a escrita das “Notas para a recordação do meu mestre Caeiro”, ao lamento do personagem Hamlet, que inveja nos atores o recurso à insinceridade como mecanismo que lhes possibilita chorarem lágrimas verdadeiras no contexto da representação teatral.

 

Nota biográfica

Flávio Rodrigo Penteado é licenciado em Letras pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (FFLCH-USP), onde atualmente elabora dissertação de mestrado em Literatura Portuguesa, a propósito do conceito de drama na obra de Fernando Pessoa. É bolseiro da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP). Publicou os artigos «Salomé ou uma história em que nos fechemos da vida» (XI SEL – Seminário de Estudos Literários. Assis, UNESP, 2013) e «O teatro da escrita em Fernando Pessoa» (Itinerários. Araraquara, UNESP, n. 34, 2012). Integra o grupo «Estudos Pessoanos», sob coordenação de Caio Gagliardi na FFLCH-USP.

 

 

Gianfranco Ferraro, Universidade de Pisa; Manuele Masini, Universidade Nova de Lisboa; Sandro Petri

 

Cartografar Pessoa

Notas sobre o Projecto de Edição Hipertextual do Livro do Desassossego

 

É lugar comum da crítica pessoana que cada edição do Livro do Desassossego seja também um novo livro. Concebido por Fernando Pessoa sempre dentro daquela tensão entre estruturação e fragmentário que foi a encenação do seu drama, o “Livro” nos convida, talvez involuntariamente, a uma contínua re-escrita combinatória que transforma o editor em co-autor/exegeta, e que convoca tanto questões especificamente filológicas, quanto uma abordagem teórica mais ampla que remeterá necessariamente à ideia de hipertexto, em várias acessões possíveis, desde a mais restrita de Genette, às teoricamente infindas possibilidades combinatórias do Barthes de S/Z, até aos Mil Planos  e ao rizoma deleuzianos. Esta comunicação é a apresentação pública dos primeiros resultados teóricos a que, desde pontos de vistas diferentes (webdesign e edição digital; filologia; filosofia), os três autores chegaram, no intuito de realizar aquela que consideram a mais sensata edição crítica do Livro: uma edição hipertextual, que tenha em consideração tanto as relações intra- e inter-textuais, como a sua enciclopédia ideal, construindo uma plataforma que permita múltiplos filtros de pesquisa e,  a níveis diferentes, uma contínua participação da comunidade científica e leitora, quer no sentido de proporcionar a possibilidade do comentário e da glosa livres, (que respondam à necessidade de re-escrita da função autoral, sem estingui-la, mas antes querendo que “rebente” dentro de uma espécie de praxe em comum do comentário), quer no sentido de uma actualização do data base em sede científica.

Da edição, promovida pela editora italiana TEXTUS, constará também uma tradução italiana, e a possibilidade de integração do maior número possível de traduções a outros idiomas.

 

Notas biográficas

 

Gianfranco Ferraro. Natural de Messina (Itália), 1981. Estudou em Pisa e Paris, e conseguiu o doutoramento em Filosofia na Università del Salento (Itália) e Ecole Pratique des Hautes Etudes (França). Interessa-se de história do pensamento alemão entre os séc. XIX e XX, com especial atenção à reflexão de Nietzsche e de Max Weber (cf. Economia del Disincanto, Pisa: Textus, 2013), logo aprofundando temáticas ontológicas e filosófico-políticas no pensamento francês contemporâneo (Foucault, Deleuze, Abensour). O interesse pela genealogia occidental da subjectividade levou até o pensamento português, com especial interesse por António Vieira, Fernando Pessoa, Agostinho da Silva e José Gil.

 

 

Manuele Masini. Natural de Massa Marittima (Itália), 1978. Mestre em Filologia Românica, interessa-se sobretudo pela literatura ibérica em todas as suas projecções geográfico-linguísticas. Foi bolseiro de importantes instituições em Portugal e Espanha (Fundação Gulbenkian, Xunta de Galícia, Instituto Ramon Llull, Casa del Traductor de Tarazona, Casa del Poeta de Trasmoz, Casa do Artista de Machico, Collège International des Traducteurs Littéraires de Arles, Fundação Biblioteca Nacional do Brasil) desenvolvendo projectos de investigação e de estudo e tradução poéticas. Traduziu para italiano, em revista e em volume dezenas de autores franceses, portugueses, espanhóis, galegos, catalães, brasileiros e aragoneses; também é responsável de vários projectos de tradução do italiano para português e espanhol. Actualmente é membro do IELT (Instituto de Estudos de Literatura Tradicional) da FCSH-Universidade Nova (Lisboa) e codirector da revista luso-italiana Submarino e da colecção de poesia alleoPoesia (Itália). Os eixos principais da sua investigação são a relação entre poesia medieval e contemporânea, a poesia e o pensamento ibéricos contemporâneos, a relação entre literatura e cinema, a crítica textual,  o estudo dos recursos poéticos na prosa contemporânea, a prosa barroca e a poética da tradução.

 

Sandro Petri. Natural de Scansano (Itália), 1969. Licenciado no ISIA (Istituto Superiore di Industrial Design) em 1996 com uma tese sobre as interfaces multi-mediais. Bolsa de Estudo  para o Mcad (Minneapolis College of Art & Design) de Minneapolis. Profissional da comunicação visual, gráfica editorial, web design, organização de exposições e museus. Organizou projectos multi-media para o Ministério dos Bens Culturais (Itália) Escola Normal Superior (Pisa, Itália), RaiEducational (Rádio Televisão Italiana), Cnr (Concelho Nacional da Investigação, Itália); trabalhou para projectos de valorização do território e dos bens culturais, a nível nacional (Itália). Publicou vários trabalhos seus nas revistas Domus, Abitare, Gap Casa, Mini International, Applicando. Em 1996 ganhou o terceiro prémio INA / Imagina para o melhor projecto multi-media estudantil europeu. Em 2006 ganhou o BardiWeb Award para a página web "La Storia siamo Noi - RaiEducational". Em 2009 ganhou o Exelab Web Award para a melhor página web de festivais em Itália.

 

 

Gustavo Rubim, Universidade Nova de Lisboa

 

O Pronome Produtivo

 

Aquém da discussão sobre a nova estrutura de autoria literária (ortónima / heterónima), há um plano em que a escrita pessoana modifica a língua portuguesa e as marcas dessa modificação fazem-se sentir no uso do pronome pessoal. Uma antologia de Pessoa organizada por Afrânio Coutinho em 1980 chamou-se O Eu Profundo e os Outros Eus e, na mesma linha, entre 2006 e 2007 Richard Zenith editou uma “Obra Essencial de Fernando Pessoa” cujos volumes de poesia se dividem em Poesia do Eu e Poesia dos Outros Eus. Os editores agem assim como efeitos do idioma pessoano e as suas estratégias são controladas pelo novo dispositivo de uso do pronome pessoal que é traço essencial da obra editada. Também a tradição crítica foi e continua a ser determinada pela relação estabelecida com a multiplicação da assinatura, ao contrário do que pretendia Eduardo Prado Coelho ao propor em 1987 uma história dos “paradigmas” dominantes nos estudos pessoanos. A hipótese do pronome produtivo como máquina criativa especificamente pessoana enfrenta apenas uma dificuldade séria: como conciliá-la com o título que Pessoa projectou para a obra do “Barão de Teive”: A Profissão de Improdutor? Esta comunicação ensaia uma resposta.

 

Nota biográfica

Ensina literatura na FCSH / UNL. Publicou um ensaio de edição de Clepsydra, de Camilo Pessanha, na revista Colóquio-Letras (nº 155/156). Autor de Experiência da Alucinação: Camilo Pessanha e a Questão da Poesia (1993, prémio Pen Clube de Ensaio), Arte de Sublinhar: ensaios (2003) e A Canção da Obra: ensaios (2008). Co-autor, com Abel Barros Baptista, de Importa-se de me Emprestar o Barroco? (2003). Co-autor, com Rita Basílio, da comédia Assim Também Eu! (em cena na temporada 2010-2011). É crítico literário no jornal Público.

 

Humberto Brito, Universidade Nova de Lisboa

 

Existir enquanto pessoa

 

Regra geral, a questão da heteronímia tem sido tratada como uma questão categorial. A pergunta “o que é um heterónimo?” significa, na literatura crítica, “o que significa existir enquanto heterónimo?” Tal sugere no entanto uma distinção — acerca da qual Fernando Pessoa se mostra tipicamente indeciso — entre existir enquanto heterónimo e existir enquanto pessoa. O meu propósito é o de, levando a sério esta indecisão, considerar (1) se podemos desfazer tal distinção; e, se tal fizer sentido, (2) que implicações isso tem para a literatura crítica.

 

Nota biográfica

Humberto Brito coordena a Rede de Filosofia e Literatura desde 2009, e é o director da Forma de Vida desde 2013. Tem escrito e publicado sobre Fernando Pessoa. É actualmente investigador de Pós-Doutoramento do Programa em Teoria da Literatura da Universidade de Lisboa.  

 

 

Inês Hipólito, Universidade Nova de Lisboa

 

Pessoa e Wittgenstein: é “autopsicografia” Inefável?

 

Há vários aspectos que nos permitem estabelecer uma conexão entre Fernando Pessoa e Wittgenstein e esta abodagem não se limita ao facto de ambos terem lidado com o problema da expressão de um mundo interior, mas também no modo como exploram o conceito “dor”. As teses de Wittgenstein acerca desta experiência que se partilha entre o eu e o outro permitem-nos compreender o poeta não como um fingidor, mas antes a criação poética de uma dor sobre a qual teve uma experiência directa e que, por ser intelectualzada parece inefável.

Este artigo pretende mostrar – à luz das Investigações Filosóficas de Wittgenstein - que, embora o Ortónimo pareça duvidar da possibilidade de exteriorização da sua experiência interna, a dor, em Autopsicografia assistimos a um grito de dor que se deixa dizer por um mundo interno. O poeta parece significar uma impossibilidade de partilha ou acesso à dor real do outro, no entanto, somos espectadores de uma tal descrição de várias camadas de dor que torna esta dor – que o poeta finge – não perdida, mas antes descoberta numa especie de metamorfose de manifestação intima sem arranjos.

 

Nota biográfica

Investigadora do Instituto de Filosofia da Linguagem da Universidade Nova de Lisboa, do projecto financiado pela FCT “Fundamentos Cognitivos do Si” e doutoranda do curso de Filosofia, na espacialidade Lógica e Filosofia da Linguagem.

 

 

Iryna Feshchenko-Skvortsova

 

Tradução de poesia do Fernando Pessoa, incluindo formas e metros greco-romanas nas odes do Ricardo Reis, para a língua russa

 

A transposição de ritmos de uma língua para outra é algo que Pessoa considerava não só possível, mas, inclusive, aconselhável no caso da tradução poética.

Em verso acentual-silábico russo não só a quantidade de sílabas é fixa, mas também a posição de acentuações. Aproveitando a investigação de L. F. Lindley Cintra, escolhi os ritmos adequados para os ritmos portugueses, por exemplo: na tradução do heptassílabo, semelhante à cançoneta popular, a quantidade de sílabas é guardada sempre, mas as posições de acentuação são flutuantes (trovas de “Quadras de gosto popular” de Fernando Pessoa); o decassílabo, que frequentemente se usa para os sonetos, em russo é tradicionalmente traduzido aproveitando jambo com cinco jambos por linha (“Passos da Cruz”).

O estudo das odes de Ricardo Reis mostra que se pode distinguir grupos separados de odes, que correspondem aos ritmos antigos, por exemplo, à estrofe alcaica ou sáfica, ou ao Asclepiadeu (Fernando Lemos, etc.). Reis imita os ritmos antigos, inventando os seus próprios ritmos na base dos antigos. Para tradução destas odes é preciso, em conformidade com a quantidade de sílabas, escolher uma estrofe antiga ou combinar os versos de estrofes diferentes, inventando uma estrofe própria que corresponde à estrofe do original. Assim traduzi 36 odes de Ricardo Reis.

 

Nota biográfica

Iryna Feshchenko (pseudónimo literário Iryna Feshchenko-Skvortsova) é doutorada em Ciências Pedagógicas, livre -docente de Pedagogia e Psicologia na Ucrânia, tem o reconhecimento de habilitações a nível de Doutoramento pela Universidade Nova de Lisboa. Poetisa, ensaísta e tradutora, membro de União dos Escritores Russos, autora de livros de poesia e ensaios sobre arte, laureada do concurso literário (crítica literária), juri do Concurso Internacional Literário (área de poesia, 2009), membro do Fórum “Século de tradução”. Publicou um livro de A. Nobre em sua tradução, as traduções de Gil Vicente, Cesário Verde, Antero de Quental, Florbela Espanca, Fernando Grade. 

 

 

Ivo Castro, Universidade de Lisboa

 

Quantas horas tem um dia triunfal?

 

Perdeu agrume a demonstração de que o dia triunfal de 8 de Março de 1914 não existiu nos termos em que Pessoa o descreveu. Aceita-se a prova material de que a criação do Guardador de Rebanhos seguiu o percurso habitual da escrita de um texto – rascunhos, cópias limpas e revisões sucessivas –, com um pico de actividade na Primavera de 1914, sem dúvida, mas com continuações prolongadas por muitos anos.  A 8 de Março, que se saiba, Pessoa descansou.

Trabalhamos hoje com a concepção elástica de um dia triunfal feito de muito mais horas que um dia normal; feito mesmo de muitos meses e anos. Nessa duração, por que motivo deveríamos considerar mais nobre a inspiração do rascunho inicial que o génio artesanal de, em retoque tardio, mudar o sentido de todo o poema?

É nesses retoques finais que assentam algumas propostas inovadoras da edição crítica de Pessoa. Nem sempre é fácil, porém, determinar a cronologia terminal das emendas. O recente aparecimento de um exemplar de Athena com emendas autorais veio complicar singularmente a edição de alguns poemas, que se afigurava tranquila.

 

Nota biográfica

Professor catedrático aposentado da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, onde ensina História da língua portuguesa e Crítica textual. Em 1988, foi nomeado pelo governo português para realizar a edição crítica de Fernando Pessoa: 19 volumes de edição e 4 de estudos publicados pela Imprensa Nacional-Casa da Moeda. Livros: Editar Pessoa (1990; 2ª ed. 2013); Curso de História da Língua Portuguesa (1991), Introdução à História do Português (2004, 2.ª ed. 2006).

 

 

Joanna Cameira Gomes, Universidade Nova de Lisboa

 

Fernando Pessoa e a Grande Brincadeira

Análise do humor no Livro do Desassossego, bastidores do «drama em gente»

 

A dimensão cómica da obra de Fernando Pessoa parece ressoar no próprio motivo que convoca este colóquio: a comemoração dos 100 anos do «dia triunfal» da ficção pessoana, ele próprio ficcionado, em que surgem através da escrita as personagens principais e as bases da encenação do drama-comédia dos heterónimos. (Este que nasce também de um dia se ter lembrado «de fazer uma partida ao Sá Carneiro»). Pretendemos demonstrar que, além da Missão civilizadora da literatura reclamada por Pessoa, a sua criação, assente numa despersonalização contínua, no jogo dialógico de dissonâncias de estilos e formas literárias que dissolve a ideia de uma verdade ou visão única, tem como motor e propósito um gozo superior ou uma Grande Brincadeira, implicada igualmente na forma como concebe o fingimento poético. Percorrendo algumas das referências ao humor na obra de Pessoa pelos seus comentadores, e seguindo as várias pistas deixadas pelo autor, analisaremos não a poesia mas a prosa em alguns aspectos do humor no Livro do Desassossego, considerando-o uma espécie de bastidores do teatro pessoano, concentrado na figura literária de Bernardo Soares, e na sua moderna consciência do «trágico da ausência de trágico».  

 

Nota biográfica

 

Joanna Gomes (1987), colaboradora no projecto Estranhar Pessoa, concluiu o mestrado na Universidade Paris-Diderot (Paris 7) em 2012, com uma dissertação sobre a obra literária e o pensamento de Fernando Pessoa intitulada Les Faces multiples du génie − génese d’une conception d’art et d’artiste et le passage à l’oeuvre. Organizou e posfaciou uma antologia bilingue (Francês e português) ilustrada de poemas do autor para o público juvenil, a publicar este ano. No cruzamento da ficção com a realidade tem-se interessado particularmente pela literatura moderna em sentido lato, pelas relações desta com a vida urbana e pelo humor em geral.

 

 

Jorge Uribe, Universidade de Lisboa

 

Os dias do dia triunfal, antes e depois do “Dia Triunfal”.

 

Em 1916 Pessoa escrevia em carta a um editor inglês: «It would be idle to pretend of Sensationism that it comes direct from the Gods or dates only from the souls of its creators, without the human concourse of forerunners or influences». Nesse momento, talvez temesse que dito modo de narração genética de uma parte da sua obra parecesse “ocioso”. Em 1935, na sempre revisitável carta de 13 de Janeiro a Casais Monteiro, Pessoa afirma a respeito do aparecimento de Alberto Caeiro: «[...] escrevi trinta e tantos poemas a fio numa especie de extase cuja natureza não conseguirei definir [...] o que se seguiu foi o apparecimento de alguem em mim [...] Apparecido Alberto Caeiro, tratei logo de lhe descobrir – instinctiva e subconscientemente – uns discipulos». Isto é, em 1935 Pessoa assemelha-se a alguém que está decidido a falar de si próprio como um vate, ou como a jumenta de Balaão, da qual alguém disse que era «unable to speak anything but what the Lord ha[d] put in [it’s] mouth». Há alguma história que os fósseis do espólio possam contar acerca desta mudança do “ocioso” para a revelação última?

 

Nota biográfica

Licenciado pela Faculdade de Artes e Humanidades da Universidad de los Andes (Bogotá), encontra-se a concluir um doutoramento no Programa em Teoria da Literatura da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa com uma dissertação acerca das relações entre a obra de Fernando Pessoa e as de Oscar Wilde, Walter Pater e Matthew Arnold. É membro do projecto crítico e editorial Estranhar Pessoa, associado ao Instituto de Filosofia da Linguagem da Universidade Nova de Lisboa (IFL) e ao Laboratório de Estudos Literários Avançados (ELAB) da mesma instituição. Actualmente é bolseiro da Fundação Calouste Gulbenkian e traduz do português para o espanhol. Tem participado em edições das obras de Fernando Pessoa, tais como Prosa de Álvaro de Campos (Ática, 2012), Sebastianismo e Quinto Império (Ática, 2011) e Trovas do Bandarra (Guimarães, 2011).

 

 

José Gil, Universidade Nova de Lisboa

 

Questões Pessoanas

 

Nota biográfica

José Gil nasceu em Moçambique e doutorou-se em Filosofia na Universidade de Paris (1982) com um estudo sobre “O Corpo como Campo de Poder”, sob a orientação de François Châtelet. Colabora com revistas portuguesas e estrangeiras e é autor de várias entradas na enciclopédia Einaudi. Foi Director de Programa do Collège International de Philosophie de Paris. Algumas das suas obras – sobre Fernando Pessoa, sobre Estética, sobre filosofia do Corpo – estão publicadas no Brasil e traduzidas em Espanha, França, Itália, Sérvia e nos EUA.

 

 

José Molina, Universidade de Bergamo

 

On me pense: de Rimbaud a Pessoa

 

A finalidade deste trabalho é demonstrar a desaparição elocutória do eu poético como programa estético em alguns dos poetas simbolistas franceses mais importantes, Charles Baudelaire, Paul Verlaine, Arthur Rimbaud, Stèphan Mallarmé. Isto, fornecerá uma linha de leitura para a criação dos heterónimos de Fernando Pessoa. Porém será importante revisar como se articula a crítica ao Simbolismo com a ideia do poema ou escrita poética como uma entidade autónoma.

 

Nota biográfica

José Molina. Licenciado em Literatura Latinoamericana pela Universidad Iberoamericana no México, e Mestre em Estudos Portuguese pela University of Massachusetts-Dartmnouth. Na atualidade realiza estudos de doutoramento no programa Erasmus Mundus Joint Doctorate Interzones. Trabalha na revista La Colmena (Universidad del Estado de México) como tradutor de poesia italiana. É autor de quatro livros de poesia e editor do livro Los sentidos del viaje (Filodecaballos, 2013), a primeira antologia do poeta chileno Tomás Harris.

 

 

Madalena Lobo Antunes, Universidade Nova de Lisboa

 

Fernando Pessoa, William Blake e o poeta como «essencialmente um místico»    

 

Num texto inédito, pertencente ao espólio, Fernando Pessoa começa com a seguinte a frase: «O poeta é essencialmente um místico». Com esta citação como ponto de partida, pretendo, nesta comunicação, olhar para Fernando Pessoa como herdeiro de uma tradição, não só mística como também profética, considerando, em particular, a figura de William Blake. Para isso, e dado que um dos objectivos deste colóquio é a revisão do estado da arte dos estudos pessoanos, tenciono, primeiro, fazer o levantamento e análise da bibliografia que aproxima as obras de Blake e Pessoa e, depois, sugerir outras linhas de leitura a partir do exame do inédito mencionado anteriormente e dos sublinhados de Pessoa nas duas obras referentes a William Blake, que se encontram na sua biblioteca, a primeira, uma edição de Poems of William Blake e, a segunda, um volume, datado de 1906, da correspondência do poeta inglês. Deste modo, irei examinar de que forma é que Fernando Pessoa adoptou e adaptou alguns aspectos da mundividência de Blake, e da sua visão da poesia, para a sua obra, nomeadamente, para a criação de Alberto Caeiro.

 

Nota biográfica

Madalena Lobo Antunes é doutoranda em Estudos Portugueses na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, bolseira da Fundação para a Ciência e Tecnologia e membro da equipa do projecto "Estranhar Pessoa: um escrutínio das pretensões heteronímicas". Redigiu uma dissertação de Mestrado sobre Álvaro de Campos e Walt Whitman e encontra-se presentemente a desenvolver a sua tese de Doutoramento sobre a consciência no Livro do Desassossego. Tem também apresentado comunicações sobre Pessoa e a sua relação com autores do modernismo britânico, nomeadamente James Joyce e Virginia Woolf, em colóquios nacionais e internacionais.

 

 

Manuel Portela, Universidade de Coimbra e António Rito Silva, Universidade de Lisboa

 

A dinâmica entre arquivo e edição no Arquivo LdoD

 

O Arquivo LdoD propõe-se construir uma representação digital do arquivo autoral e editorial do Livro do Desassossego. Esta representação consiste num espaço de virtualização interativa do LdoD que permite experimentar o vai e vem entre arquivo e edição, e entre edição e arquivo. Ao simular as dinâmicas de escrita, leitura e edição, o Arquivo LdoD torna possível apreender, em simultâneo, a dimensão projetual do LdoD enquanto conceito e a sua instanciação material e histórica enquanto artefacto.

 

Notas biográficas

Manuel Portela é Professor Auxiliar Agregado no Departamento de Línguas, Literaturas e Culturas da Universidade de Coimbra, onde coordena o Curso de Doutoramento «Estudos Avançados em Materialidades da Literatura». É investigador do Centro de Literatura Portuguesa da Universidade de Coimbra. Colaborou como investigador no projeto ‘PO-EX ’70-’80: Arquivo Digital de Literatura Experimental Portuguesa’ (2010-2013, CECLICO, Universidade Fernando Pessoa) e é o investigador responsável pelo projeto ‘Nenhum Problema Tem Solução: Um Arquivo Digital do Livro do Desassossego’ (PTDC/CLE-LLI/118713/2010).

 

António Rito Silva (INESC-ID Lisboa, Universidade de Lisboa), doutorado em Engenharia de Sistemas e Computadores pela Universidade Técnica de Lisboa (1999), é Professor Associado do Departamento de Engenharia Informática do Instituto Superior Técnico (IST), Universidade de Lisboa, e investigador do INESC-ID (Instituto Nacional de Engenharia de Sistemas e Computadores – Investigação e Desenvolvimento em Lisboa). Foi Diretor do Centro de Informática do IST entre 2002 e 2008. Especialista em engenharia de software, tem trabalhado nos últimos anos no domínio dos sistemas colaborativos, software social e design organizacional. Integra a equipa do projeto «Nenhum Problema Tem Solução: Um Arquivo Digital do Livro do Desassossego» (PTDC/CLE-LLI/118713/2010).

 

 

Manuela Parreira da Silva, Universidade Nova de Lisboa

 

Os deuses e a guerra, no modo de dizer de António Mora

 

O neo-pagão António Mora tem um vasto conjunto de «livros» atribuídos por Pessoa. O terem ficado incompletos e lacunares não nos impede, no entanto, de constatar a extrema coerência dessa obra «imperfeita». Com ela se confronta o próprio Fernando Pessoa, discutindo, por exemplo, com o seu «outro», sobre as razões e as des-razões da intervenção alemã na Grande Guerra. A polémica esboçada é uma peça importante na determinação do grau de autonomia do não-heterónimo face ao seu criador.

 

Nota biográfica

Professora auxiliar da FCSH, é membro integrado do IELT (Instituto de Estudos de Literatura e Tradição). Dedica-se, desde 1988, ao estudo do espólio pessoano, sendo responsável por várias edições, nomeadamente, Correspondência Inédita, de Fernando Pessoa (1996); Correspondência, de Fernando Pessoa (2 volumes, 1998, 1999); Poesia , de Ricardo Reis (2000), Poesia , de Fernando Pessoa  (3 volumes, 2005-2006); Prosa, de Ricardo Reis (2006), Cartas de Amor de Fernando Pessoa e Ofélia Queiroz (2012), O Regresso dos Deuses e outros Escritos de António Mora (2013).

 

 

Maria do Céu Estibeira, Universidade de Lisboa

 

De que falavam, quando falavam de Caeiro? – a vivência do “Mestre” na família heteronímica

 

Ao ser apelidado de “Mestre” por Fernando Pessoa, Alberto Caeiro assume um papel determinante na constituição da família heteronímica, ao personificar a instância parental deste enredo de personalidades.

Apresentando-se como o poeta da natureza, da atitude anti-mística e da objectividade absoluta, Caeiro provoca reacções no ortónimo e em alguns heterónimos, que com ele comungaram algumas realidades, ou com ele estabeleceram contacto ao longo das suas vidas heteronímicas.

A presente comunicação pretende apresentar as visões que outros heterónimos e personalidades literárias tiveram de Alberto Caeiro, como o entendiam, que afinidades estabeleceram com ele, ou como avaliaram a sua “entidade” e produção literária. Assim, serão apresentados alguns textos que incidem sobre o modo como Caeiro era percepcionado pelos que com ele se cruzaram, perspectivando as relações dos que integraram este “drama em gente”.

 

Nota biográfica

Doutorada pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, com a dissertação A Marginalia de Fernando Pessoa. Pós-Doutoranda pela mesma Faculdade. Professora do ensino básico e secundário; docente na Escola Superior de Educação Almeida Garrett. Membro da equipa "Estranhar Pessoa", tem vindo a desenvolver pesquisas na área dos estudos pessoanos e, mais particularmente, da marginalia pessoana. Participou em diversos colóquios em Portugal e no estrangeiro e publicou diversos artigos, relativos quer aos estudos sobre marginalia, quer acerca de outras temáticas da obra de Fernando Pessoa.

 

 

Mariana Gray de Castro, University of Oxford e Universidade de Lisboa

 

A carta de Fernando Pessoa sobre o Dia Triunfal é de Samuel Taylor Coleridge - e não é a chave verdadeira do Dia Triunfal

 

Nesta comunicação, revelo que a descrição que Pessoa faz do seu processo criativo, na célebre carta a Adolfo Casais Monteiro sobre a génese dos heterónimos, foi profundamente influenciada pelo Prefácio de Coleridge para o poema 'Kubla Khan' - e que esta carta não é a chave verdadeira do Dia Triunfal. Proponho, então, que ela seja substituída de imediato pelo artigo que Pessoa escreveu sobre o Prefácio de Coleridge, intitulado 'O homem de Porlock', por ser ele o verdadeiro relato do que se passou nesse dia.

 

Nota biográfica

 

Mariana Gray de Castro é investigadora de pós-doutoramento na University of Oxford e a Universidade de Lisboa. Há vários anos que investiga, ensina e publica sobre Fernando Pessoa, interessando-se sobretudo pelo fenómeno da heteroníma e pela influência de escritores de língua inglesa (Oscar Wilde, William Shakespeare, William Wordsworth, etc.) na arte e no pensamento do Poeta. Organizou o livro de ensaios Fernando Pessoa's Modernity Without Frontiers: Influences, Dialogues and Responses (Londres, 2013) e a antologia Amo como o Amor Ama: Escritos de Amor de Fernando Pessoa (Lisboa, 2013).

 

 

Nuno Amado, Universidade de Lisboa

 

O dia triunfal do dia triunfal

 

No poema VIII d’“O Guardador de Rebanhos”, além de um anticlericalismo que consiste, em boa medida, em caracterizar o Menino Jesus como um “Cupido católico” (Pessoa usa a expressão para descrever o Menino Jesus num artigo sobre o livro vencedor do Prémio Literário SPN em 1934, A Romaria, cujo fito principal era sustentar que o autor, o padre Vasco Reis, representava condignamente o “catolicismo amoroso” característico dos portugueses), é também pouco característico de Caeiro, geralmente descrito como mestre e não como discípulo, a referência a alguém que afinal “a mim ensinou-me tudo”. Que o Menino Jesus foi para Caeiro o que o próprio Caeiro foi para Reis, Campos, Mora e até para Pessoa confirma-o ainda a tendência sistemática para os discípulos retratarem o mestre ora à semelhança de um deus, ora à semelhança de uma criança, tendência cujo melhor exemplo é talvez a expressão de Campos em que as duas características, a divindade e a meninice, se associam: “o semi-deus creança”. Se o dia triunfal da vida de Pessoa, na fantasia que fez chegar a Casais Monteiro, foi o dia em que Caeiro lhe apareceu, é assim perfeitamente plausível assumir que o aparecimento de uma criança “tão humana que é divina” no poema VIII, não por acaso a narração de um sonho, represente o dia triunfal do próprio Caeiro. Admitindo a coincidência das duas narrativas e a coincidência de ser este, precisamente, o oitavo poema do conjunto, tem por desígnio esta comunicação explicar de que modo é possível falar de um dia triunfal do dia triunfal.

 

Nota biográfica

Nuno Amado é Doutorando do Programa em Teoria da Literatura, da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, encontrando-se actualmente a escrever uma dissertação sobre Fernando Pessoa. Obteve, em 2008, no mesmo Programa em Teoria de Literatura, o grau de Mestre com uma dissertação sobre Franz Kafka. É bolseiro FCT no âmbito do projecto “Intenção, Acção e a Filosofia da Arte: Novas Fronteiras para uma Teoria da Acção”, desenvolvido pelo Instituto de Filosofia da Linguagem (IFL) da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, e colabora regularmente com o projecto “Estranhar Pessoa: um Escrutínio das Pretensões Heteronímicas”.

 

 

Odelia Hitron, Freie Universitaet Berlin

 

Liquid Biographies

 

While O dia triunfal has been addressed to as a problematization of the biographical - one which, by means of pluralisation, renders impossible any attempt to trace the heteronyms back to a single 'source,' or an origin - less attention has been given to the way in which heteronymity problematizes not only sequences or narratives, but also time itself. This paper focuses on the work of the semi-heteronym Bernardo Soares - he who had neither a birth-day nor a birth-date, but was born "in Portuguese language" [LdD 259] - in order to address heteronymity's claim to infinity. A close reading of a passage from Livro do desassossego will be offered, suggesting that the book's temporality is indeed dependent on a certain present - yet not one that can be seen as an "always" but rather by a constant "here and now" of the text. Implications of such procedures on issues of heredity, belonging and the idea of a homeland (pátria) will be examined as well, portraying Pessoa's "liquidation" of biographies as one that takes place on the seam between literary and civil spheres.

 

Nota biográfica

Odelia Hitron, licenciada em Psicologia e Musicologia pela Universidade Hebraica de Jerusalém e mestre em Estudos Culturais na mesma universidade. Atualmente é bolseira da Gulbenkian e faz um doutoramento no Instituto de Línguas e Literaturas Românicas da Freie Universität de Berlim que tem por objeto de estudo principal o Livro do Desassossego numa perspetiva comparativa com a poesia de Paul Celan. Tem realizado diferentes atividades relacionadas com a literatura e a tradução. Lecionou em Jerusalém na Academia ‘Bezalel‘ de Belas Artes e Design, e no departamento de Estudos Culturais da Universidade Hebraica. Publicou ensaios sobre questões de crítica cultural, literatura comparada e teoria psicanalítica.

 

 

Osvaldo Manuel Silvestre, Universidade de Coimbra

 

Política, técnica e poética do arquivo

 

Estará em pauta o devir-arquivo de Pessoa e a forma como esse devir responde a uma política que é também uma fase das técnicas de produção moderna do arquivo. A questão central serão contudo as possibilidades que uma poética do arquivo (analógico e digital) abre ao nosso entendimento de Pessoa. 

 

Nota biográfica

Osvaldo Manuel Silvestre é doutorado em Teoria da Literatura e Professor Auxiliar do Departamento de Línguas, Literaturas e Culturas da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. Dirigiu a licenciatura de Estudos Portugueses e Lusófonos entre 2006 e 2009. Publicou ensaios e livros sobre questões de teoria, estética, literaturas de língua portuguesa, literatura comparada, artes e crítica cultural. É membro do Centro de Literatura Portuguesa da Universidade de Coimbra e integra a equipa do projeto «Nenhum Problema Tem Solução: Um Arquivo Digital do Livro do Desassossego» (PTDC/CLE-LLI/118713/2010).

 

 

Pablo Javier Pérez López, Universidade Nova de Lisboa

 

O Conflito que nos queima a Alma: Teive e Antero

 

“O Conflito que nos queima a alma, deu-o Anthero mais que outro poeta, porque tinha a egual altura do sentimento e da inteligencia. É o conflito entre a necessidade emotiva da crença, e a impossibilidade intellectual de crer”, são estas palavras do Álvaro Coelho de Athayde, Barão de Teive, no seu único manuscrito sobrevivente: A Educação do Stoico.

A presente comunicação visa mostrar as afinidades entre o pensamento trágico de Teive e de Antero de Quental compreendidas essencialmente como luta irresolúvel entre vida e razão, entre pensamento e sentimento, expressão máxima daquilo que Miguel de Unamuno chamava el sentimento trágico de la vida. Os documentos e intuições apresentadas propõem mostrar estas afinidades assim como a importância de Antero e o diálogo com as suas obras no seio do pensar trágico pessoano.

 

Nota biográfica

Pablo Javier Pérez López: Doutor em Filosofia pela Universidade de Valladolid (Espanha). Autor do livro Poesía, Ontología y Tragedia en Fernando Pessoa (Manuscritos, Madrid 2012), co-editou os livros Viajes, literatura y pensamiento (Uva, 2009), El pensar poético de Fernando Pessoa (Manuscritos, Madrid, 2010), Ibéria. Introdução a um Imperialismo Futuro, de Fernando Pessoa. (Ática, Lisboa, 2012) e Filosofía y Literatura. Diálogo recobrado. (Manuscritos, Madrid, 2013). Foi ainda recentemente antologista e tradutor do livro “Los Mató la vida. Antología de escritores suicidas portugueses”, Tragaluz, Medellín, 2013). Desde Setembro de 2013 é investigador do projecto Estranhar Pessoa na Universidade Nova de Lisboa.

 

 

Paola Poma, Universidade de São Paulo

 

Caeiro: nem mais nem menos

 

Este ensaio se propõe a pensar  a obra de Alberto Caeiro não como uma poética que tenha na sua construção um tipo de falha subjetiva como quer grande parte da crítica pessoana, mas como uma teoria  - “aprendizagem do desaprender” - que se esforça em mostrar o mecanismo consciente do autor de dessubjetivar ao máximo a linguagem e, consequentemente, o sujeito.  Tal projeto caeiriano retoma, em alguma medida, as preleções de Hegel sobre a história da filosofia:  “O homem (do mundo grego) não estava ainda tão voltado sobre si mesmo como em nossa época. Era, fora de dúvida, sujeito, mas não se havia posto como tal”.  Talvez este esvaziamento  do sujeito como centro do mundo seja a origem do   “poeta bucólico de espécie complicada”; complicação esta que Pessoa/Caeiro desdobra refutando a modernidade sem deixar de ser moderno.

              

Nota biográfica

Paola Poma: Professora Doutora de Literatura Portuguesa no Departamento de Letras Clássicas e Vernáculas da Universidade de São Paulo. Investigadora de Poesia Portuguesa Moderna e Contemporânea com pós-doutoramento na Universidade Nova de Lisboa, tendo sido bolsista FAPESP. Participa do Grupo de Pesquisa Gelic – Grupos de Estudos em Literatura Contemporânea sediado na Unesp – Araraquara. Desde 2013 é coordenadora de Pós-Graduação de Literatura Portuguesa na Usp.

 

 

Paula Cristina Costa, Universidade Nova de Lisboa

 

Sensacionismo, o ismo triunfal de Pessoa

 

Pretende-se com esta comunicação revisitar alguns lugares de sentido do Sensacionismo na obra pessoana, tais como:

 - Repensar o drama-em-gente também como um drama-em-ismos;

 - Questionar o desassossego da coerência da incoerência do sensacionismo;

- Problematizar a criação sensacionista dos heterónimos como a criação numa quarta dimensão da mente; 

- A coexistência do clássico e do contemporâneo: pensar a dimensão pós-modernista do sensacionismo.

 

Nota biográfica

Paula Cristina Lopes da Costa é Professora Auxiliar com Agregação da FCSH da Universidade Nova de Lisboa. A sua área de investigação é a Literatura Portuguesa Contemporânea. Integra o projecto «Estranhar Pessoa». A sua dissertação de mestrado intitula-se «As dimensões artísticas e literárias do projecto sensacionista» (1990, inédita), e a tese de doutoramento «António Ramos Rosa, um poeta in fabula» (Quasi Edições, 2005). Colaborou em «Pessoa Inédito» (Livros Horizonte, 1993 ) e no «Dicionário de Fernando Pessoa e do Modernismo Português» (Caminho, 2008).

 

 

Paula Mendes Coelho, Universidade Aberta

 

“O princípio baço do dia...”: revisitações do Simbolismo em F. Pessoa

 

O fundo decadente da obra de Pessoa tem sido alicerçado numa trama teórico-ideológica que sistematicamente assimila Decadentismo e Simbolismo. Propõe-se nesta comunicação reequacionar e reavaliar este incontornável substracto teórico, filosófico e poético a partir da teorização dos franceses, mas sobretudo à luz do contributo específico do Simbolismo belga.

Assim, para além da “leitura” que Pessoa fez de Mallarmé (“Je suis cet homme.[...]”; “[...]et j´ai lu tous les livres.”), será analisada a inegável marca deixada por Maeterlinck, leitor de Carlyle e de Ruysbroek l´Admirable, na obra pessoana.

 

Nota biográfica

Paula Mendes Coelho é doutorada em Estudos Franceses, na especialidade de Literatura Comparada, é docente do Departamento de Humanidades da Universidade Aberta, Lisboa, onde coordena o “Mestrado em Estudos Comparados-Literatura e Outras Artes”, depois de ter coordenado a Licenciatura em Estudos Artísticos (2007-2010). Desenvolve desde há anos actividades em prol da Promoção da Leitura/Motivação para a Leitura literária. É autora da obra Questões de Poética Simbolista. Do Romantismo à Modernidade (FCT/FCG, 2006) para além de ensaios no âmbito dos Estudos Comparados. É investigadora do Instituto de Estudos de Literatura Tradicional-Patrimónios, Artes e Culturas (IELT, FCSH-Universidade Nova de Lisboa) e colaboradora do Centro de Estudos das Migrações e das Relações Interculturais (CEMRI, Universidade Aberta).

 

 

Pedro Sepúlveda, Universidade Nova de Lisboa

 

A correcção do dia triunfal

 

A discussão em torno do dia triunfal, 8 de Março de 1914, data em que terá aparecido o mestre Alberto Caeiro, passa necessariamente pela apreciação dos testemunhos relativos a acontecimentos desse dia, ou seja, os manuscritos. Esta apreciação mostra como a esta data é conferido um forte valor sistémico, no âmbito de uma narrativa que enquadra a obra, independentemente da sua maior ou menor adequação a acontecimentos reais.

Num desses testemunhos, datável de início dos anos 30, Pessoa indica 13 de Março como data do dia triunfal, sobrepondo posteriormente a variante 8 de Março, aquela que irá seguir nas Notas para a Recordação do meu Mestre Caeiro e na famosa carta a Adolfo Casais Monteiro. Procurarei explicar esta hesitação entre duas datas, assim como a opção pelo dia 8 de Março, justificando-a com base na necessidade de uma correcção da epifania.

 

Nota biográfica

Pedro Sepúlveda é Investigador de Pós-Doutoramento na FCSH da Universidade Nova de Lisboa e Coordenador Executivo do Projecto de I&D “Estranhar Pessoa: um escrutínio das pretensões heteronímicas”. O âmbito da sua investigação inclui o estudo de autores da modernidade literária e filosófica, a tradução de escritores de língua alemã e a edição da obra de Pessoa. Publicou recentemente um ensaio decorrente da sua tese de Doutoramento, intitulado Os livros de Fernando Pessoa (Ática, 2013).

 

 

Pedro Tiago Ferreira, Universidade de Lisboa

 

Filologia como curadoria e co-autoria: O Caso Pessoa

 

O Livro do Desassossego é uma obra fragmentária e incompleta que tem vindo a ser objecto de um debate filológico e literário centrado na questão de se apurar até que ponto é possível vir a fixar-se uma versão definitiva e canónica do texto.

Esta questão suscita uma analogia com dois termos jurídicos: "revogação" e "curadoria". É pretensão inerente à actividade de muitos filólogos que as suas edições "revoguem" todas as edições anteriores. Na medida em que esta "revogação" carece de coercividade, visto não existir, na filologia ou na literatura, nenhum princípio semelhante ao princípio jurídico "lei posterior revoga lei anterior", qualquer tipo de revogação operará somente na base da qualidade do trabalho e no prestígio do próprio filólogo.

Quanto à segunda analogia, o filólogo comporta-se como um curador, i.e., alguém responsável por gerir o património de uma pessoa ausente. O Livro do Desassossego necessita de ser "curado" visto que, tal como deixado por Pessoa, não é publicável. Assim sendo, compete ao filólogo tomar decisões autorais, tais como decidir que fragmentos incluir, que anotações à margem considerar, ou se uma rasura efectivamente o é. Nestes termos, o filólogo desempenha uma actividade análoga à de um curador.     

 

 

Raquel Nobre Guerra, Universidade de Lisboa

 

A experiência da multidão em Álvaro de Campos e Walt Whitman

Especificidades, nexos e divergências

 

Tomamos como ponto de partida o argumento ontológico e as noções de «eu» e «existência» em Álvaro de Campos e Walt Whitman, dele extraindo as especificidades, nexos e divergências que se manifestam nos programas estéticos de cada um dos autores, nos poemas Song of Myself e

Saudação a Walt Whitman, respectivamente. Trata-se também de evidenciar numa leitura comparativa, o diálogo entre ambos, nele discernindo e demonstrando aproximações e divergências na correlação das bivariadas formulações dos conceitos de «tempo», «infinito»,

«totalidade», «diversidade», «unidade» e «fraternidade».

 

Nota biográfica

Raquel Nobre Guerra (n. Lisboa 1979). Licenciada e mestre em Filosofia pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, investiga para o doutoramento a categoria de «fragmento» em Fernando Pessoa sob patrocínio da Fundação para a Ciência e Tecnologia. Colaborou no projecto de digitalização da biblioteca particular de Fernando Pessoa. É membro integrado do Centro de Literaturas de Expressão Portuguesa da Universidade de Lisboa, e membro colaborador do Instituto de Estudos de Literatura Tradicional da Universidade Nova de Lisboa e do Instituto de Filosofia Luso-Brasileira.

 

 

Richard Zenith

 

O Reis Triunfal

 

Na sua carta a Casais Monteiro de 13 de Janeiro de 1935, Fernando Pessoa garante que “um vago retrato” de Ricardo Reis lhe surgiu em 1912, dois anos antes do “aparecimento” nele de Alberto Caeiro, a 8 de Março de 1914. Muito antes dessa célebre carta, por volta de 1915, Pessoa redigiu um texto prefacial dizendo que o “Dr. Ricardo Reis nasceu dentro da minha alma no dia 28 de Janeiro de 1914”. Em que medida esta precedência cronológica corresponde à realidade? Sabemos que Álvaro de Campos derivou de Caeiro e a sua entrada em cena também foi triunfal, pois o primeiro poema por ele assinado tem toda a força e exuberância prometidas pelo título: “Ode Triunfal”. Mas qual é a relação originária, “concepcional”, entre Ricardo Reis e Alberto Caeiro, e em que consiste o triunfo do heterónimo classicista?

 

Nota biográfica

Richard Zenith, originário dos EUA, emigrou para Portugal em 1987. Investigador, ensaísta e organizador de numerosas edições de Fernando Pessoa, é também conhecido como um tradutor – de Pessoa, de Camões e de poetas mais recentes, incluindo Sophia de Mello Breyner, João Cabral de Melo Neto e Carlos Drummond de Andrade. 

 

 

Rita Patrício, Universidade do Minho

 

Da mão que nos conduz: o autor como condição de leitura

 

Em diversos momentos, Pessoa deixou testemunho do modo como lia a leitura literária, explicitando o que entendia dever ser atendido para o seu sucesso. Nesses textos, que implicam uma teorização do literário enquanto objecto a ser lido, tornam-se evidentes traços de uma poética autoritária: assim, a partir deles, pretendo pensar como nos textos de Pessoa se apresenta a figura de autor enquanto condição de leitura e como podem estas indicações sobre a leitura literária interessar à leitura dos textos pessoanos e às questões particulares que eles concitam.

 

Nota biográfica

Rita Patrício é Professora Auxiliar da Universidade do Minho e membro do seu Centro de Estudos Humanísticos. Doutorou-se nessa Universidade em 2009 com a tese Episódios. Da teorização estética em Fernando Pessoa, actualmente no prelo. Editou, conjuntamente com Jerónimo Pizarro, em 2006, Obras de Jean Seul de Méluret, o volume VIII da  Edição Crítica de Fernando Pessoa; e, em 2004, com Carlos Mendes de Sousa, Largo mundo alumiado – estudos em  homenagem do  Professor Vítor Aguiar e Silva . Em 2001, publicou Conhecimento de Poesia: a crítica literária segundo Vitorino Nemésio, que resultou da tese de mestrado apresentada à Universidade do Minho. Tem publicado vários artigos, em volumes colectivos e em revistas especializadas, decorrentes dos seus estudos sobre teoria da literatura e literatura portuguesa moderna e contemporânea. Integra a equipa do projecto «Estranhar Pessoa».

 

 

Roberto Francavilla, Universidade de Génova

 

Eversão na eversão. Leituras políticas de Pessoa em Itália.

 

Em Itália, em 1979, nas páginas do buletim “Controinformazione” redigido pela ala “intelectual” das Brigate Rosse (Brigadas vermelhas), um dos grupos terrorísticos que marcaram tragicamente uma inteira época da história italiana moderna (os assim chamados “anos de chumbo”), aparecia um artigo de elevado teor: As vanguardas da dissolução. Neste artigo, entre outras leituras políticas da cultura e do universo editorial italiano, dedicava-se um inteiro capítulo à análise da editora Adelphi (de Milão), chegando à conclusão que a verdadeira virada no sentido duma “contrarivolução sobre-estrutural” tinha-se manifestado com evidência através da publicação de Una sola moltitudine, a primeira antologia poética de Fernando Pessoa. A partir deste momento tem surgido, algo sistematicamente, uma série de tentativas (na maioria dos casos sem qualquer aprofundamento teórico e baseadas em leituras esporádicas e superficiais) de identificação de Pessoa como um dos “númens tutelares” do fascismo europeo. A minha proposta de contribuição tenta recolher e analizar estas leituras e as suas influências no debate cultural mas sobre tudo político, tendo como campo de acção a sociologia da literatura.

 

Nota biográfica

Roberto Francavilla é Professor Associado de Literatura Portuguesa e Brasileira na Universidade de Génova, onde também lecciona no Doutoramento em Literaturas Comparadas. Anteriormente desenvolveu trabalhos de investigação como bolseiro do Instituto Camões e da Fundação Calouste Gulbenkian. Colabora com o Programa de Pós-graduação em “Português Língua Estrangeira” na Faculdade de Letras de Lisboa. Publicou livros e artigos sobre literatura portuguesa, brasileira e africanas de expressão portuguesa. É tradutor e crítico literário. É autor dos projectos criativos Hotel Sodade (com o fotógrafo Filippo Romano) e Pessoa / Persona (com o artista António Jorge Gonçalves).

 

 

Rui Sousa, Universidade de Lisboa

 

Os bastidores de Orpheu: o Dia Triunfal e os heterónimos à luz da correspondência

 

Nesta comunicação procuraremos analisar a construção ficcional associada ao Dia Triunfal e à criação e desenvolvimento dos heterónimos a partir das cartas trocadas pelos autores de Orpheu. Será nossa intenção perceber de que modo a correspondência introduz o discurso sobre os heterónimos no âmbito dos desenvolvimentos de um projecto artístico colectivo e da desejada diversidade de uma revista vanguardista como Orpheu. Teremos em conta as considerações tecidas a respeito dos heterónimos por Mário de Sá-Carneiro, Alfredo Guisado, Armando Côrtes-Rodrigues e outros, assim como a expressão epistolográfica do seu contributo cúmplice no “drama em gente”, uma vez que se referem aos heterónimos em termos artísticos mas também de acordo com os aspectos da sua biografia e com a ficção da sua existência efectiva. Procuraremos também perceber que prolongamentos e diferentes abordagens poderão ser detectadas no discurso epistolográfico sobre a heteronímia depois deste primeiro momento e se isso poderá sugerir um momento específico da sua concepção no contexto de Orpheu que depois seria revisto em função de outras fases da existência e do pensamento pessoanos.   

 

Nota biográfica

Rui Sousa (n. 1985) concluiu Licenciatura em Estudos Portugueses e Mestrado em Estudos Românicos – Literatura Portuguesa Moderna e Contemporânea pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Investigador do CLEPUL, dedica-se, enquanto bolseiro da FCT, a uma tese de Doutoramento que abordará o percurso de construção estética, discursiva e performativa de um imaginário moderno de sujeito artístico relacionado com a libertinagem, a maldição poética e a marginalidade heterodoxa, explorando com especial atenção a receção desses modelos nos autores do Surrealismo-Abjecionismo em Portugal.

 

 

Simão Valente, University of Oxford

 

Caeiro e Pascoli: vias paralelas de um neoclassicismo

 

 O oitavo poema de “O Guardador de Rebanhos” de Alberto Caeiro tem tradicionalmente sido analisado com referência ao paganismo do heterónimo, mais recentemente tendo em conta fontes simbolistas ou ainda Walt Whitman, especificamente no seu tratamento da natureza e da espiritualidade. Em 1887, o poeta italiano Giovanni Pascoli publica um opúsculo em tom de manifesto intitulado Il Fanciullino – “O Rapazinho” - onde expõe a sua poética da criança interna enquanto fonte original da intuição e dos textos do poeta. É útil conceber o enquadramento destes textos num período histórico em que se reavalia a noção de infância na psicologia e nas instituições europeias, notavelmente com a publicação dos primeiros estudos de Jung e Freud. Tal é uma questão acessória ao eixo central desta comunicação em que se pretende estudar o poema em causa e Il Fanciullino no contexto de uma comum posição neoclássica levada a cabo  através do reutilizar o topos do puer aeternus, especialmente na representação de um sujeito textual que internaliza essa figura da Eterna Criança como origem da sua própria linguagem e perceção poéticas. Em Caeiro e Pascoli, a tradição como nova vanguarda.

 

Nota biográfica

Simão Valente é Leitor de Português na Universidade de Oxford, onde é também aluno de Doutoramento em Medieval and Modern Languages, estando a trabalhar numa tese sobre Fernando Pessoa e a literatura policial Anglo-americana. Anteriormente concluiu dois mestrados em Literatura Francesa e Italiana nas Universidades de Estrasburgo e Bolonha, tendo obtido a Licenciatura em Artes e Culturas Comparadas na FLUL. É também membro do Centro de Estudos Comparatistas da FLUL.

 

 

Victor K. Mendes, University of Massachusetts Dartmouth

 

A ave contra os animais de Alberto Caeiro

 

Álvaro de Campos afirma perentoriamente, nas suas  memoráveis “Notas para a recordação do meu mestre Caeiro”, que o poeta pastor “não gostava de animais”. É uma afirmação temerária que, prima facie, parece uma descrição falhada dum poeta pastoril. Partindo de detalhes dos poemas VIII e XLIII do ciclo “O guardador de rebanhos”, este paper procura averiguar os usos da animalização de figuras humanas e divinas, bem como a estranha lógica da oposição dos animais em Alberto Caeiro. Entre as suspeitas preliminares estão as de que os usos antinómicos da animalidade possam oferecer uma desconstrução do cristianismo e um substituto para a figura incómoda do poeta precursor. Garantidamente, uma explicação cabal será apresentada para, no dizer de Campos, Caeiro não gostar de animais.

 

Nota biográfica

Victor K. Mendes é professor associado da Universidade de Massachusetts Dartmouth e diretor do PhD in Luso-Afro-Brazilian Studies and Theory. Foi editor da revista semestral Portuguese Literary & Cultural Studies (1998-2013) e é editor da série de livros híbridos de acesso livre Luso-Asio-Afro-Brazilian Studies & Theory (2008-presente). Entre os seus contributos mais recentes para os estudos pessoanos estão os artigos “Estratégias diferentes na análise da obra de Fernando Pessoa” (2007) e “The Ecology of Writing: Maria José’s Fernando Pessoa” (2013) [disponível em http://umassd.academia.edu/VictorMendes]. E-mail: vmendes@umassd.edu

 

 

Vincenzo Russo, Universidade de Milão

 

A poesia pensa o século XX: Fernando Pessoa lido por Alain Badiou.

 

Pensar o século XX como uma cartografia de documentos - de vestígios que restituem, por descontinuidade, o significado que o século adquire para os actores do próprio século - é a tarefa filosófica levada a cabo por Alain Badiou que a partir da década de 90, em ocasião de um dos Colóquios de Cerisy (1997), vêm instaurando um complexo diálogo com a obra pessoana. Para Badiou, pensar o século XX significa destrinçar as singularidades do pensamento novecentista tanto em termos históricos (individuar o que foi pensado como anteriormente não-pensado) quanto em termos hermenêuticos (individuar o que foi pensado como impensável). Fernando Pessoa, segundo Badiou, pode ser interpretado não apenas como um dos testemunhos-chave  da excecional estreia criadora (entre 1890 e 1914) definida idade dos poetas mas também como reinventor da ideia de poesia «que tem a tarefa de dar um nome ao século». A obra de Fernando Pessoa, para além de compensar um imaginário nacional carenciado, atribui à própria poesia esforços hercúleos para o inteiro século ser repensado. Badiou reconhece ainda como a reflexão filósofica do século XX está longe de ser sintonizada com a poesia de Pessoa que, num desafio singular ao pensamento contemporâneo, não se deixa sujeitar às suas formas e medidas.

 

Nota biográfica

Vincenzo Russo é Professor Auxiliar de Literatura Portuguesa e Brasileira no Departamento de Línguas e Literaturas Estrangeiras da Università degli Studi di Milano. Tem-se interessado pela poesia portuguesa, pelo pensamento português contemporâneo e pela teoria pós-colonial. Para lá de vários artigos, publicou em volume Suspeita do Avesso. Barroco e Neobarroco na Poesia Contemporânea Portuguesa (2008). Organizou várias edições italianas de autores portugueses, brasileiros e africanos de expressão portuguesa (Pessoa, Eça de Queirós, José Luís Peixoto, Eduardo Lourenço, António Ramos Rosa, Pepetela, Lima Barreto, Boaventura de Sousa Santos).